Disputas em ex-repúblicas da União Soviética crescem em hora difícil para Putin
No dia em que comemorou 70 anos de vida, na última sexta-feira, Vladimir Putin convidou chefes de Estado dos países da Comunidade dos Estados Independentes (CEI), criada após o desmantelamento da União Soviética, para uma “reunião informal” em São Petersburgo, como ato preparatório para uma reunião de cúpula do grupo no Cazaquistão, na próxima quarta-feira (12). O encontro aconteceu em um dos momentos mais complexos das relações entre Moscou e as antigas repúblicas soviéticas, quando cresce a percepção de que a Rússia está perdendo parte de sua influência e algumas divergências do passado são retomadas com força.
Pouco mais de três décadas depois do fim da URSS, alguns problemas herdados dos tempos soviéticos ainda são presentes. A começar pela disputa entre Armênia e Azerbaijão, centrada no status do enclave de Nagorno-Karabakh, que em 2020 levou a uma guerra com mais de dois mil mortos e, no mês passado, motivou novos episódios de violência, deixando mais de 280 mortos dos dois lados da fronteira.
Durante o processo de formação das repúblicas soviéticas, Moscou não levou em consideração fatores locais, como divisões entre as diferentes nacionalidades no Cáucaso e na Ásia Central. Isso ficou evidente nos processos de independência, quando estouraram conflitos de grande porte, como a guerra no Tadjiquistão (1992-1997) e em Nagorno Karabakh (1988-1994), e enfrentamentos de menor intensidade, como entre uzbeques e quirguizes em Osh, no Quirguistão, em 1990. Na Moldávia, cerca de 12% do território são controlados por um governo separatista nostálgico dos tempos soviéticos, a Transnístria, que hoje serve como uma base avançada do Exército russo.
Ambições imperiais
Além de fronteiras mal traçadas, o desejo da Rússia de retomar o antigo posto de “centro do império” contribuiu para a instabilidade nas antigas repúblicas da URSS. Em 2008, um ano depois de Putin declarar, na Conferência de Segurança de Munique, que o “mundo unipolar havia acabado”, a Rússia invadiu a Geórgia, sob o pretexto de proteger a população russa em duas áreas separatistas, a Ossétia do Norte e a Abkházia. O conflito durou alguns dias, mas gerou duas entidades autônomas e reconhecidas por Moscou como Estados independentes.
Em 2014, em meio ao caos da Euromaidan, na Ucrânia, a Rússia invadiu e posteriormente anexou a Crimeia e apoiou milícias separatistas no Leste do país, no que se tornou a base para a guerra iniciada em fevereiro, que agora levou a quatro novas “anexações”: de Kherson, Donetsk, Zaporíjia e Luhansk, embora nem Moscou saiba quais são as fronteiras dessas regiões anexadas.
Agora, distante da órbita de influência da Rússia, Kiev quer seguir os mesmos passos de outras três ex-repúblicas — Estônia, Lituânia e Letônia — rumo à União Europeia e, eventualmente, à Otan.
Olhos para China e Europa
A postura mais agressiva de Moscou também faz com que outros países da antiga União Soviética busquem seus próprios caminhos. Embora nenhum tenha adotado as sanções do Ocidente, eles se abstiveram ou não votaram em resoluções na ONU condenando Moscou e chegaram a criticar a invasão, como o fez o líder cazaque, Kassym-Jomart Tokayev.
Dados dos últimos anos apontam que a China ganhou espaço dos russos na disputa pelo posto de maior parceiro comercial da Ásia Central, e Pequim vem despejando bilhões de dólares como parte da Iniciativa Cinturão e Rota — entre os principais projetos está o chamado Corredor Transcaspiano, que liga a China à Europa e ao Mediterrâneo através de Cazaquistão, Geórgia e Azerbaijão.
A Europa também busca ocupar espaço. Na semana passada, líderes de Armênia e Azerbaijão se encontraram na primeira cúpula de um novo fórum multilateral, a Comunidade Política Europeia, capitaneada pelo presidente francês, Emmanuel Macron — a Rússia não está incluída entre os 44 países convidados, e outras ex-repúblicas soviéticas, como Geórgia, Moldávia e Ucrânia, aderiram. Na sexta, a União Europeia confirmou que vai enviar uma “missão civil” para ajudar a delimitar as fronteiras entre Azerbaijão e Armênia.
Por Redação