Calor extremo e moradias pouco resistentes ao fogo: veja o que se sabe sobre os incêndios florestais que já mataram 122 no Chile

Sob calor extremo e moradias pouco resistentes ao fogo, o Chile enfrenta os incêndios florestais mais mortais de sua História recente, com mais de 120, um número que, segundo as autoridades, aumentará. O que se sabe até agora é que no auge do verão no Hemisfério Sul, desde a semana passada, foram registradas ondas de calor de 40ºC.

Na sexta-feira, incêndios simultâneos irromperam nos morros de Viña del Mar e em outras áreas da região de Valparaíso, principalmente, que fica cerca de 120 quilômetros a noroeste da capital Santiago.

O fogo se multiplicou e se propagou pelo vento, explicou Miguel Castillo, da Faculdade de Ciências Florestais da Universidade do Chile. Quando a vegetação ou o lixo entram em combustão, gera-se ar quente leve “que eleva partículas incandescentes ou brasas que viajam centenas de metros, provocando focos secundários” de fogo, explica o acadêmico.

Ondas de temperaturas máximas mais o vento são uma combinação “desastrosa”: as chamas se aceleram “em declive e a favor do vento”, tornando-as mais letais.

Até as 22h locais de sábado, 37 incêndios florestais estavam em combate, enquanto 46 estavam sob controle.

Os incêndios foram tão mortais por que o fogo atingiu áreas densamente povoadas de Viña del Mar, principalmente. Em apenas um ponto, Villa Independencia, houve 19 mortes. Lá e em outros setores, famílias se amontoaram em construções leves, mesmo em terrenos onde estava planejado construir corta-fogos, conforme autoridades e especialistas.

Ano mais quente já registrado, 2023 teve aquecimento brutal: 50% dos dias acima do limiar de perigo
Porém, materiais leves como madeira, abundantes nesse tipo de moradia, funcionam como combustível e acabam superando o zinco e o fibrocimento, resistentes ao fogo.

As chamas portanto correram pelas estreitas ruas dos morros, fazendo explodir fileiras de carros estacionados em frente às casas, conforme relataram sobreviventes.

Agora está sendo avaliado se, apesar dos avisos de evacuação enviados via celular, as pessoas não quiseram sair.

“Os alarmes foram acionados, mas a evacuação aparentemente não funcionou (…). É dado muito ênfase aos combates, mas não tanto à prevenção (…) e eu acredito que essa é uma deficiência”, opina Horacio Gilabert, do Centro de Mudança Global da Universidade Católica do Chile.

Incêndios intencionais

“Estamos investigando a eventual intencionalidade desses incêndios”, disse no sábado o presidente Gabriel Boric. Segundo a Corporação Nacional Florestal (Conaf), 99,7% dos incêndios são causados intencionalmente ou por imprudência.

Diante das emergências cada vez mais frequentes de incêndios, a “intencionalidade tem aumentado continuamente”, embora a lei puna com até 20 anos de prisão os responsáveis dolosos por incêndios, que raramente são detidos em flagrante. No caso de incêndios involuntários, a pena é de até cinco anos.

Na atual emergência, ocorreram “focos simultâneos e isso é totalmente anormal”, aponta o professor Castillo.

Crise climática

Nesta parte do território americano, o fenômeno natural e cíclico do El Niño se tornou mais intenso e frequente devido ao aquecimento global causado pela atividade humana, segundo cientistas. Esse fenômeno eleva a temperatura do Oceano Pacífico, gerando secas ou inundações.

“Uma mudança de apenas alguns graus no Pacífico Tropical pode fazer a diferença entre uma temporada de incêndios florestais relativamente leve e uma catástrofe generalizada”, explica o climatologista Raúl Cordero em um estudo recentemente publicado na Scientific Reports, da editora Nature.

No ano passado, o Chile passou por um período atípico de chuvas em meio a uma seca prolongada, o que fez crescer arbustos que acabam se tornando depósitos de combustível.

Enfrentando da emergência

Apoiados por 31 helicópteros e aviões com uma capacidade de descarga significativa (de retardante de chamas e de água), cerca de 1.400 bombeiros, 1.300 militares e voluntários combatem as chamas.

O presidente Boric, que em quase dois anos de governo aumentou em 47% o orçamento para prevenção e combate a incêndios, decretou estado de exceção por catástrofe para mobilizar o máximo de recursos. Em áreas de Valparaíso, foi decretado toque de recolher por horas para liberar as rotas para passagem de veículos de emergência ou facilitar a evacuação.

No entanto, apesar dessas ações, o Chile está em dívida com a revisão e modernização de sua estratégia diante de catástrofes dessa magnitude.

Não temos “equipamentos de combate aéreo noturno (…). Portanto, a probabilidade de que todo o trabalho realizado durante o dia seja perdido durante a noite é cada vez maior”, disse Michel De L’Herbe, especialista em gestão de emergências, à rádio Cooperativa.

Por Redação

Mostrar Mais
Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *