Lula cobra União Europeia por acordo “equilibrado” com o Mercosul
Em negociação há duas décadas, o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul monopolizou a visita que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, fez a Brasília. Em cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se queixou das mudanças propostas em março pelos europeus, que teriam desequilibrado o acordo. Mais evasiva, a líder europeia exaltou a importância e a dimensão do acordo, mas citou “obstáculos” para a sua conclusão.
Além do encontro com Lula, von der Leyen participou de evento organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Durante a solenidade, o presidente da entidade, Robson Andrade, defendeu a assinatura da versão antiga do texto, que chegou a consenso em 2019, mas que acabou não sendo assinada. Lula, por sua vez, defende mudanças na versão anunciada pelo antecessor, Jair Bolsonaro.
Um dos pontos que o presidente brasileiro não abre mão é o das compras governamentais. A ideia é ampliar a margem de preferência das pequenas e médias empresas. Lula lembrou que os países desenvolvidos voltaram a dar largos subsídios a suas indústrias e reivindicou o direito de fazer o mesmo.
“A Europa e os EUA voltaram a reconhecer, após ciclos de liberalismo exagerado, a importância da ação do Estado em políticas industriais. Programas bilionários de subsídios foram adotados nos países desenvolvidos em favor da reindustrialização”, disse o presidente. “O Brasil, que sofreu um grave processo de desindustrialização, tem ambições similares. Por isso, manterá o poder de conduzir as políticas de fomento industrial por meio do instrumento das compras públicas”, completou Lula.
Ele também se queixou da previsão de punições ao Brasil colocada pelo lado europeu, especialmente para questões ambientais. Segundo Lula, “a premissa que deve existir entre parceiros estratégicos é a da confiança mútua, e não de desconfiança e sanções”.
No Planalto, von der Leyen, disse que “é chegada a hora de concluir o acordo” e que espera que isso ocorra “no mais tardar no fim do ano”. Não comentou, contudo, as críticas de Lula. Na CNI, ela disse que o acordo está “próximo de ser fechado”, mas que ainda existem “obstáculos” que podem “encurtar” os fluxos de comércio e o potencial da relação entre os dois blocos. Não detalhou os entraves e disse apenas que o acordo é o “maior e mais ambicioso já negociado” e que “seus benefícios são claros”.
“Nosso acordo vai estabelecer parâmetros claros para os direitos dos trabalhadores, proteção do meio ambiente e cadeias de suprimento sustentáveis”, disse ela. “Isso significa que os consumidores vão confiar nos produtos que vão comprar”, completou a representante europeia.
Os dois líderes também falaram sobre a guerra na Ucrânia. Lula reforçou a posição brasileira de condenar a invasão russa, mas disse que “não há solução militar para esse conflito”. “Precisamos de mais diplomacia e menos intervenções armadas na Ucrânia, na Palestina, no Iêmen”, afirmou. Também voltou a defender a reforma no Conselho de Segurança da ONU, colegiado no qual o governo petista almeja um assento permanente para o Brasil.
“Reformar as instituições de governança global, em especial o sistema financeiro global é inadiável, para colocá-lo a serviço da produção, do trabalho e do emprego. Reformar o Conselho de Segurança das Nações Unidas é garantia de que teremos capacidade coletiva de responder, com eficiência e credibilidade, às ameaças à paz e à segurança internacional”, disse Lula.
Aliada de primeira hora da Ucrânia, von der Leyen disse que qualquer proposta de paz deve estar em linha com o que dizem as convenções das Nações Unidas. “É claro que queremos paz. E ninguém mais do que os próprios ucranianos. Mas ela deve ser uma paz justa. Uma paz que defenda os princípios da Carta da ONU e o direito do povo ucraniano de ser dono de seu próprio futuro”, disse ela ao citar a proposta do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky.
Após a passagem pelo Brasil, a presidente da Comissão Europeia segue para a Argentina, onde tem reunião com o presidente Alberto Fernández e participa de um fórum empresarial. Na quarta-feira estará em Santiago com o presidente chileno, Gabriel Boric. A abordagem mais recente da UE na América Latina reflete a preocupação dos europeus com a crescente participação dos investimentos chineses na região.
Por Redação