Espionagem chinesa testa novos campos na disputa global com Estados Unidos

A saga do balão chinês que entrou no espaço aéreo dos Estados Unidos entre o fim de janeiro e o começo de fevereiro evidenciou a escalada da tensão entre as duas potências e também jogou luz no projeto de Pequim de sofisticar cada vez mais seus aparatos militares e de espionagem.

Inegavelmente, Pequim tem se preparado de fato nas últimas décadas para diminuir a distância para Washington em termos de poderio militar e inteligência. Com o final da Guerra Fria, na década de 1990, os EUA se posicionaram bem à frente de potenciais rivais.

Mas mesmo nesses tempos em que a disputa pelo poder global arrefeceu com o domínio americano, a espionagem praticada pelos Estados Unidos permaneceu em ação — e incluiu até nações consideradas “amigas”.

Basta lembrar que o Brasil teve a ex-presidente Dilma Rousseff e outros membros do seu governo grampeados pela Agência Nacional de Segurança (NSA, na sigla em inglês).

O que ocorre agora é que o desenvolvimento econômico e tecnológico da China, além da consolidação do poder e do projeto do presidente Xi Jinping, despertaram ambições para entrar numa disputa de poder global com os EUA que passa por espionagem e operações militares.

“O objetivo é superar o poder americano, neutralizar o Ocidente e colocar novamente o foco do mundo na China. Ao longo da história, através de uma clássica percepção estratégica chinesa, o país deve estar unido, unificado e no centro do mundo”, diz à BBC News Brasil Emmanuel Véron, especialista em China contemporânea pelo Instituto Nacional de Línguas e Civilizações Orientais (Inalco), da França.

Para Amanda Hsiao, do think tank Crisis Group, “o incidente com o balão demonstra o quão frágil é o relacionamento entre EUA e China e com um pequeno incidente para rapidamente escalar para um evento político que tira dos trilhos qualquer tentativa de estabilizar a relação”.

Guerra pela informação

A coleta de informações via objetos voadores como balões seria mais uma fronteira explorada pela inteligência chinesa. Um artigo de março de 2018 veiculado por um jornal patrocinado pelo Exército de Libertação Popular, o braço militar do Partido Comunista Chinês, já apontava a necessidade de investigar as mais diversas camadas atmosféricas por razões de segurança.

A maior batalha atual, no entanto, está em limitar o acesso à informação em qualquer campo
sensível.

Da parte dos Estados Unidos, o governo Joe Biden vem proibindo recentemente a venda de tecnologia americana para companhias chinesas. Há pouco mais de dez dias foi anunciada a inclusão de mais cinco empresas e um instituto de pesquisa da China em uma lista de vetos.

A preocupação é que negócios privados chineses vêm sendo incentivados a trabalhar com mais proximidade e sinergia com os militares desde a ascensão de Xi ao poder. Por sinal, um modelo baseado nas parcerias estabelecidas entre o Pentágono e companhias privadas americanas.

Exército de hackers

Outra frente importante desenvolvida nos últimos anos está no espaço cibernético. Hackers chineses têm empregado táticas ousadas para explorar vulnerabilidades online. Uma pesquisa da empresa de segurança online Mandiant disse que a ação de hackers chineses comprometeu as redes de computadores de ao menos seis Estados americanos entre 2021 e 2022.

Em depoimento ao Congresso americano no ano passado, Winnona DeSombre, pesquisadora de Harvard, disse que as capacidades da China na área rivalizam ou já superam as dos EUA.

De acordo com o pesquisador Dean Cheng, inteligência artificial e machine learning serão aplicados a um grande escopo de operações militares.

“O desenvolvimento sustentado e colocado em prática da tecnologia da informação, incluindo inteligência artificial, big data e computação em nuvem, tudo isso foi combinado para criar ‘novas circunstâncias’ em operações militares.”

A preocupação com as habilidades da China no ciberespaço foi manifestada também em uma inédita declaração conjunta no ano passado dos chefes do FBI, a polícia federal americana, e o MI5, do serviço secreto britânico.

Segundo Christopher Wray, diretor do FBI, o programa chinês de hackers é maior do que todos os similares de grandes potências combinados.

Por Redação

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *