Argentina “exporta” crise pela fronteira uruguaia
Uruguaios estão cruzando a fronteira para comprar comida e combustível mais baratos na Argentina – abalada pela crise econômica. Mas isso está mergulhando os negócios uruguaios na área fronteiriça em uma crise própria.
Enquanto o peso argentino, que perdeu cerca de 25% de seu valor em relação ao dólar este ano, no Uruguai – com uma inflação de 6% ao ano -, a moeda local se fortaleceu em relação ao dólar. Com isso, o comércio uruguaio na fronteira perdeu competitividade.
A gerente do supermercado uruguaio, Noelia Romero, disse que as vendas estão em queda acelerada. Ela trabalha na cidade de Fray Bentos, separada por uma ponte sobre o rio Uruguai da cidade argentina de Gualeguaychu.
“Fomos duramente atingidos na venda de mantimentos e produtos de limpeza”, disse Romero.
“No Uruguai o combustível custa o equivalente a US$ 1,58 por litro e na Argentina pagamos US$ 0,53”, disse Robert de Lima, que rodou 45 km do Uruguai a Gualeguaychu para encher o tanque.
Abelardo Alzaibar, dono de farmácia em Fray Bentos, disse que, mesmo com incentivos do governo uruguaio para atenuar o problema, a diferença de preços cria “enormes” problemas para o comércio local. “Há estabelecimentos fechando e nenhum sinal de que isso vá acabar logo”, afirmou.
Desaceleração na Argentina
A inflação argentina surpreendeu em junho, com uma desaceleração mais acentuada do que a esperada pelos analistas. O índice de preços ao consumidor – o último a ser anunciado antes das votações primárias para as eleições presidenciais do país – subiu 6% no mês, segundo informou ontem o Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec).
O resultado da inflação nacional mensal de junho ficou bem abaixo da taxa de 7,1% da cidade de Buenos Aires, divulgada na semana passada, e das previsões do mercado, entre 7,2% e 7,4%, o que levantou desconfiança entre alguns economistas. Outros sugeriram um possível represamento de preços — o que armaria uma bomba-relógio ao próximo governo.
A aproximação das eleições de outubro e das Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias – as Paso, que na prática funcionam como se fosse o primeiro turno -, em agosto, alimentou essas dúvidas. Sobretudo em razão de o candidato governista ser o ministro da Economia, Sergio Massa.
“Essas ilações e desconfianças são inevitáveis, diante das circunstâncias políticas e do histórico dos governos peronistas em relação a dados oficiais”, disse uma fonte ligada ao mercado argentino, sob a condição de anonimato.
Mesmo com a desaceleração, a inflação acumulada em 12 meses segue bem acima de 100%, atingindo 115,6% em junho, o patamar mais alto registrado no país desde agosto de 1991.
“Já se previa que o número de junho viria menor do que o de maio, e muito dessa desaceleração dos preços tem a ver com algumas características sazonais da economia do país, que registra menor atividade econômica em junho e julho”, afirmou o consultor argentino Sergio Berenzstein, que disse não acreditar em manipulação dos índices oficiais nem na hipótese de uma taxa de inflação mais baixa no mês favorecer o candidato do governo.
“Pode ser que Massa use o dado mensal eventualmente na campanha, mas não creio que o futuro dele esteja ligado à inflação de junho”, disse ele. “Até porque o índice está muito longe da meta anunciada em sua posse, de manter a inflação em 3% mensais.”
Já para o analista da consultoria Orlando J. Ferrerés & Asociados, Nicolás Alonzo, o dado de junho deve ser observado com cautela. “É um número que veio muito abaixo do esperado, mas é certo que estamos passando por um dos piores períodos de queda da atividade econômica e isso ajuda a moderar os dados de inflação”, diz. “Também é certo que em períodos de inflação descontrolada, os indicadores são sempre voláteis, com altas e baixas muito bruscas”, afirmou.
Alonzo também pondera que a alta do dólar paralelo (blue) em maio foi menos acentuada do que em períodos anteriores, o que pode ter contribuído para uma desaceleração significativa nos preços de junho. Além disso, o governo de Alberto Fernández intensificou seu programa de controle depreços de itens da cesta básica — medida que represa a inflação.
Em razão disso, preços de alimentos e bebidas não alcoólicas (que subiram 4,1%), vestuário e calçados (4,2%) e bebidas alcoólicas e tabaco (4,6%) ficaram abaixo da média de aumentos de junho. O setor que sofreu com maior aumento de preços foi o de comunicações, com alta de 10,5%.
Por Redação