Inflação em janeiro perde força na Argentina e dá respiro a Milei em batalha política com o Congresso

O primeiro índice de inflação na Argentina sob o comando de Javier Milei indica uma desaceleração na alta dos preços. Segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec), a inflação subiu 20,6% em janeiro, depois de uma alta de 25,5% em dezembro. O refresco dá um respiro político a Milei, depois de uma dura derrota no Congresso na última semana, quando seu projeto de reforma econômica retornou às comissões legislativas por falta de apoio dos deputados de sua base.

Ainda de acordo com o Indec, a variação anual dos preços chegou a 254,2%, a maior desde os anos 1990. Embora ainda muito alta, o resultado de janeiro envia um sinal positivo ao governo que acabou de completar dois meses e havia prometido conter a sombra de uma hiperinflação no horizonte.

Parte da alta está relacionada à retirada de subsídios anunciada por Milei, sobretudo no setor de transportes, telefonia e banda larga, e na extinção de regras que tabelavam preços de serviços, como por exemplo, os planos de saúde. O setor de bens e serviços, subiu 44,4%, seguido por transporte que registrou aumento de 32,6%. A alta dos alimentos, que prejudica sobretudo os mais pobres, no entanto, perdeu força.

Consultoras argentinas e internacionais preveem que a tendência de recuo na inflação se manterá ao longo deste ano e é possível que a Argentina retroceda a uma inflação anual abaixo de 200%.

Vitória política

O dado é uma vitória do governo em meio a uma série de reveses que vem sofrendo este ano. Milei desencadeou uma crise política na semana passada ao sair em uma cruzada contra quem chamou de “traidores”. Após voltar à estaca zero em sua chamada Lei Ônibus, que visava reformular aspectos profundos da economia e do Estado argentino, o presidente promoveu uma caça às bruxas a deputados e governadores de sua própria base de apoio, colocando em xeque o futuro de seus planos econômicos.

“O governo é otimista [com as futuras taxas de inflação], mas tudo dependerá de como vai ir manejando esses dilemas políticos”, afirmou o professor de Economia da Universidade de Buenos Aires (UBA) Fabio Rodriguez. “Agora, quando voltar de sua viagem, é muito importante que Milei envie um sinal de contenção da crise política”, completou em referência às viagens a Israel, ao Vaticano e Roma que Milei fez nos últimos sete dias.

Recessão proposital

Economistas dizem que a inflação subiu menos em janeiro em consequência da aposta da equipe de Milei em controlar a alta do dólar e em dar um choque recessivo na economia argentina, fazendo com que as pessoas comprem menos.

“O dado de janeiro é positivo e tem duas causas fundamentais para essa desaceleração que já não são, entre aspas, positivas: congelar o tipo de câmbio e a queda no consumo”, explica o economista e diretor do Instituto de Trabalho e Economia da Fundação German Abdala, Juan Manuel Telechea. “É bem conhecido na Argentina que a inflação se move muito em consonância com o que acontece com o valor do dólar. Então, ao promover a desvalorização de maneira drástica e depois manter o câmbio fixo, vemos essa desaceleração.”

Ao desvalorizar o peso argentino em mais de 50% em dezembro, Milei fixou o preço do dólar oficial a 800 pesos argentinos. Por um tempo, o dólar paralelo – e os outros vários tipos de câmbio do país – não aumentaram drasticamente em resposta, como havia acontecido em desvalorizações anteriores.

“Os alimentos dispararam em novembro e dezembro”, afirma Fabio Rodriguez. “E em janeiro começamos a ver menos aumento em algumas áreas, o que é óbvio porque com menos dinheiro e menos capacidade aquisitiva, se começa a esfriar a subida de preços. Como não podem subir ao infinito, começaram a retroceder”.

Queda no consumo

O outro fator apontado por Telechea é a queda no consumo, que segue uma lógica de que com menos gastos, menos dinheiro circula e logo o salto inflacionário desacelera. “O governo espera que a demanda discipline a inflação”, afirma.

O problema, apontam ambos os economistas, é o quanto esta lógica é sustentável com o passar do tempo. O câmbio já voltou a apresentar subidas – embora muito menores em comparação com o período eleitoral. Nesta quarta, o dólar paralelo mais utilizado (chamado de dólar Blue) cotava acima de 1.100 pesos. Já a queda no consumo, que trará um recessão certa, tem um custo humano alto que em breve tende a se refletir no humor da população.

Por Redação

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